No momento em que a febre amarela volta a assombrar Minas Gerais, o poder público bate cabeça. Seis meses depois de finalizado o maior surto da história, dados sobre a cobertura vacinal ainda estão desatualizados. Informativo divulgado ontem pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) atribui a ocorrência da doença este ano à falta de vacinação. E aponta seis cidades da Zona da Mata, Sul, Noroeste e Centro-Oeste do estado como tendo as menores taxas de imunização do estado, com cobertura inferior a 40%. Os municípios se surpreenderam com os números e relataram índices bem superiores, alguns deles chegando a 100%. A doença tem apresentado letalidade alta no estado: desde dezembro, dos 12 pacientes com diagnóstico positivo, 11 morreram.
A cobertura vacinal média do estado atualmente é de 81%, o que significa 3,6 milhões de pessoas não imunizadas. A corrida agora é para alcançar a meta, de 95%. Das 28 regionais de saúde, 12 têm cobertura vacinal inferior a 80%. A maioria está localizada próximo a São Paulo (veja mapa), que também vive um surto este ano. De acordo com a SES, aquelas com menor taxa são Pouso Alegre, no Sul de Minas (66,6%); São João Del-Rei, no Campo das Vertentes (69,1%); e Ponte Nova, no Leste do estado (71%).
Além disso, há 342 municípios mineiros que não atingiram a meta vacinal. Nas contas da secretaria, entre os mais críticos, estariam Bias Fortes (34,5%) e Santana do Manhuaçu (38,6%), na Zona da Mata; Pocrane (37,3%), no Vale do Rio Doce; Aiuruoca (35,8%), no Sul; Santana do Jacaré (36,8%), no Centro-Oeste; e Formoso (39,9%), no Noroeste.
Questionada sobre as incoerências, a SES respondeu, por meio de nota, que a responsabilidade da atualização dos dados é dos municípios. Mas, o único lugar que admite que isso ocorreu foi Bias Fortes, onde, por erro de uma funcionária, os dados não foram atualizados no sistema. Na cidade, a cobertura é de 98%, segundo o prefeito Fabrício Almeida (PP). "Esse erro não devia ter ocorrido, ainda mais no meio de um surto. Eu soube disso na semana passada e chamei a funcionária, que estava de férias, para fazer a atualização", relata.
Em Santana do Jacaré, o vice-prefeito Basílio do Souto Teixeira informou que a cidade tem pelo menos 75% da população vacinada. "Estamos fazendo levantamento e vacinando de casa em casa e, se a pessoa tem dúvidas ou perdeu o cartão, a dose já é aplicada ali mesmo", disse. Em Pocrane, o secretário Municipal de Saúde, Dante Florêncio, acredita que tenha havido algum problema na migração de informação entre os sistemas, já que a cidade conseguiu vacinar 100% da população. "Passamos um aperto danado no surto do ano passado. Tivemos uma morte por febre amarela e os moradores ficaram muito assustados. Mobilizamos muitas equipes, até de outras secretarias, para ajudar. E ainda vacinamos pessoas de cidades vizinhas", afirma.
Em Aiuruoca, a cobertura também ultrapassa e muito a taxa de 35,9% anunciada pela SES, chegando a mais de 90%, de acordo com o secretário Municipal de Saúde, Fábio Nable. "Está errado, já avisamos e não corrigiram. Não temos caso algum de febre amarela, dengue, chikungunya, nada. Nem macaco morto. Somos referência em termos de saúde na região. Por sermos uma cidade turística, vacinamos, inclusive, gente de São Paulo e do Rio de Janeiro", garante.
Em Formoso, a secretária Municipal de Saúde, Gláucia Hilário, também se surpreendeu com a taxa de 39,9%. "Ano passado, fizemos um bloqueio geral na cidade e todo mundo foi vacinado. A maioria dos moradores tomaram duas doses, pois ainda não tinham sido definidos os novos parâmetros, de que apenas uma é suficiente", disse. A reportagem ligou para a prefeitura de Santana do Manhuaçu, mas não conseguiu falar com ninguém. A SES informou que os dados foram encaminhados pela área técnica e fazem parte do Sistema de Informação do Programa Nacional de imunização (Sipni), do Ministério da Saúde. Segundo a pasta, a base de dados é atualizada pelos próprios municípios e as divergências podem estar ocorrendo porque eles não atualizaram o sistema ou porque estão usando outra base de dados.
BH investiga três casos
A febre amarela pode ter feito muito mais vítimas em Minas Gerais. Estão sendo investigados 34 casos suspeitos, sendo oito mortes, de acordo com o boletim divulgado ontem pela Secretaria de Estado de Saúde (SES). Vale lembrar que os sintomas da doença são similares aos de outras febres hemorrágicas. Em Belo Horizonte há três notificações em investigação. No período 2017/2018, que teve início em julho, 12 pessoas receberam diagnóstico positivo para a doença do tipo silvestre. Desses, 11 pacientes não resistiram aos sintomas e morreram. Casos notificados em Belo Horizonte estão sendo analisados para esclarecer se o contágio ocorreu na capital.
O último caso confirmado pela doença, por meio de exames laboratoriais liberados pela Fundação Ezequiel Dias (Funed), foi em Goianá, na Zona da Mata mineira. No balanço divulgado pela pasta na quinta-feira da semana passada, havia 11 casos confirmados e nove mortes. Na contagem de ontem, está o caso de um morador de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), que estava internado no Hospital Eduardo de Menezes, na capital, e morreu na quinta. O hospital, aliás, chegou a divulgar em seu site nota por meio da qual afirmava ter 14 pacientes internados com suspeita da doença. A informação foi retirada do ar logo depois, por orientação da SES, que vai centralizar os dados.